A PENITÊNCIA - Conto de Theodore de Banville
A
PENITÊNCIA
Theodore
de Banville
(1823
– 1891)
Tradução
de Humberto de Campos
(1886
– 1934)
Frei
Andoche, da ordem dos capuchinhos, que fora a Vanes pregar pela quaresma, é um
santo feio como o diabo. Seu velho rosto parece ter sido feito a machado em
qualquer tronco de árvore, e sua barba sem trato é como uma erva rara que os
carneiros já tivessem tosquiado. Como, porém, sabe conduzir as suas ovelhas
aonde quer, ora pela carícia de uma voz persuasiva, ora a golpes de bastão, e,
fecundo em recursos, não é apanhado nunca de surpresa — as penitentes
sucedem-se no seu confessionário, na velha igreja, onde o campanário se atira
vertiginosamente para o céu.
Acaba
ele de despachar muitas formosas damas e camponesas, que devolve limpas e
brancas como o linho estendido no campo depois de lavado, quando se lhe ajoelha
diante a linda Guilhermina Josselim, cujo seio é levantado por profundos
soluços, e que, sob as suas rendas e a sua cabeleira de ouro, chora como uma
pequena Madalena. É que ela viu passar através das giestas o filho do senhor, o
jovem conde Olivier, montado no seu belo cavalo sírio, e, ao vê-lo tão belo,
sentiu a tentação de beijá-lo. Por isso apenas, ela se acredita amaldiçoada sem
misericórdia, e, com toda a sua força de criança, bate no peito,
mortificando-o.
Frei
Andoche não encobre a Guilhermina a gravidade do caso; todavia, não quer a
morte da pecadora, e, após lhe haver recomendado a penitência de muitas
orações, ajunta, ainda:
—
E como o seu pecado foi querer beijar um homem bonito, o castigo consistirá em
dar um beijo no homem mais feio e repugnante da paróquia.
—
Oh, padre!... Eu beijar vossa reverendíssima?!... — exclama ingenuamente a
rapariga, horrorizada, e que se torna toda vermelha, como se sentisse, já, na
face florida a rude barba do capuchinho.
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