O PROPICIADOR DO BEM - Conto Alegórico - Oscar Wilde
O PROPICIADOR DO BEM
Oscar Wilde
Tradução de Paulo Soriano
(Tradução de autor desconhecido do início do séc. XX)
Era de noite e Ele estava só.
Divisou, ao longe, os muros de uma cidade circular e caminhou para a cidade.
Aproximando-se, ouviu, na cidade, grande algazarra de alegria e risos de prazer, juntos com o som estridente de numerosos alaúdes. E bateu à porta e abriram-lhe. Viu uma casa, que era de mármore, com belas colunas de mármore na fachada.
As colunas estavam cobertas de grinaldas e, tanto dentro como fora, ardiam troncos de cedro. E Ele entrou na casa de mármore.
Quando, depois de atravessar a sala de calcedônia e a sala de jaspe, chegou à grande sala dos festins, viu, estendido sobre um leito de púrpura, alguém cuja cabeleira estava coroada de rosas vermelhas e cujos lábios estavam vermelhos de vinho.
Passou por detrás dele, tocou-lhe no ombro e disse-lhe:
—Por que levas essa vida?
O rapaz voltou-se, reconheceu-o, e respondeu, dizendo:
—Então… Noutro tempo, eu era um leproso e tu curaste-me. Como poderia viver doutra maneira?
Saiu Ele da casa e pôs-se a andar pelas ruas. A breve distância, viu uma mulher com o rosto e os vestidos pintados, e cujos pés iam calçados de pérolas. E atrás dela seguia, lentamente, como alguém que vai espiando, um jovem cujas vestes eram de duas cores. O rosto da mulher era tão belo como o rosto de um ídolo, e os olhos do rapaz brilhavam de desejo. Seguiu-os e, tocando a mão do rapaz, disse-lhe:
—Por que olhas assim para essa mulher?
O mancebo voltou-se, reconheceu-o e, rindo-se, disse-lhe:
—Então… Noutro tempo, eu era cego e tu deste-me a vista. Como poderia olhar doutra maneira?
Apressou Ele seus passos, tocou o vestido pintado da mulher, e disse-lhe:
—Não há outra senda a seguir que não seja a senda do pecado?
A mulher voltou-se, reconheceu-o e, sorrindo, disse-lhe:
—Então… Perdoaste minhas culpas. A senda que sigo é a senda que me dá prazer.
E Ele saiu da cidade. Quando ia andando já fora, viu, sentado à beira do caminho um rapaz que chorava.
Aproximou-se dele e, tocando-lhe os compridos anéis da sua cabeleira, disse-lhe:
—Por que choras?
O rapaz alçou os olhos, reconheceu-o e respondeu:
—Então… Eu, noutro tempo, estava morto e fizeste-me levantar dentre os mortos: que posso fazer senão chorar?
Fonte: “Pelo Mundo”, edição de agosto de 1922.
Fizeram-se breves adaptações textuais.
Ilustração: Caravaggio (1571 – 1610)
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