ALEGRIA DA VIÚVA - Conto de Teófilo Braga

ALEGRIA DA VIÚVA

Teófilo Braga

(1843 – 1924)

 

Era uma vez um homem casado; a mulher dizia que morria por ele, e que Deus nunca dera a ninguém um marido assim. O homem fiava-se naquelas palavras, e quando andava no campo a trabalhar dizia para o criado:

— Não há ninguém que tenha uma mulher como a minha.

O criado disse que não era bom experimentar, porque podia ficar enganado. Disse o patrão:

— Agora é que desafio todo o mundo para me mostrarem uma mulher melhor do que a minha.

— Pois eu estou pronto para uma experiencia. À noite, quando formos para casa, vai o patrão atravessado na palha fingindo que morreu, e o resto fica por minha conta.

Assim aconteceu; o criado chegou mais tarde do que o costume, bateu à porta, e com grande pranto contou como o patrão tinha morrido de repente. Quando a mulher ia começar a fazer grandes choros, disse-lhe o criado:

— Oh minha ama; é melhor não dar a saber isto à vizinhança, porque se enche logo a casa de gente, e tudo quanto lhe vier fazer companhia quer de comer e grandes esmolas, e assim nós dois podemos passar a noite ao pé do corpo.

— Dizes bem, Valentim; pela manhã logo, se dirá que morreu.

Pegaram ambos no corpo e foram deitá-lo em cima de uma cama; passado algum tempo, diz o criado:

— Oh. minha ama, a gente não ceia nada? Isto morto como morto, e vivo como vivo.

 

— Pois dizes bem, vou fazer folar e tu vai lá abaixo buscar uma infusa de vinho.

Passado mais algum tempo, diz outra vez o criado:

— Oh, minha ama, deixe-me deitar um bocadinho no seu colo, ando tão moído do trabalho.

— Pois sim, Valentim.

Tornou, depois o criado:

— O meu amo quando era vivo

Dizia-me que casasse contigo.

Respondeu a mulher:

— Também ele me dizia a mim

Que casasse contigo, meu Valentim.

O marido não quiz esperar por mais para certificar-se, e nunca mais fez caso dela em toda a sua vida.

 

Ilustração: Anders Zorn (1860 – 1920).

 

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