O PRISIONEIRO DE MÔNACO - Conto de Liev Tólstoi
O
PRISIONEIRO DE MÔNACO
Liev
Tólstoi
(1828
– 1910)
Há
cerca de cinco anos, houve um crime no principado. A cidade de Mônaco é
pacífica e tal coisa jamais havia acontecido. Os juízes se reuniram para julgar
o assassino. No tribunal havia juízes, promotores, advogados e jurados. No
julgamento, condenaram o acusado, de acordo com a lei, à pena extrema: à
decapitação.
Apresentaram
a sentença ao príncipe, que a confirmou. Restava apenas executar o criminoso. O
infelizmente, não havia guilhotina ou carrasco no principado. Depois de muito
meditar, os ministros decidiram escrever ao governo francês, perguntando este poderia
enviar uma máquina de morte e o carrasco para cortar a cabeça do criminoso. Ao
mesmo tempo, pediram que os informassem, se possível, sobre os custos que isso
implicaria. Uma semana depois, receberam a resposta: eles poderiam enviar a
guilhotina e o carrasco: as despesas seriam dezesseis mil francos. Participaram
ao príncipe a resposta do governo francês. Ele meditou por um bom tempo. Dezesseis
mil francos!
—
Esse patife não vale tanto dinheiro! Não seria possível resolver o problema de
uma forma mais econômica? Para obter essa quantia, todos os habitantes do reino
teriam de pagar dois francos de imposto, o que lhes pareceria demasiado. O povo
poderia sublevar-se — disse.
Reuniu-se
um conselho. Como resolver o problema? Ocorreu aos conselheiros formular o
mesmo pedido ao rei da Itália. A França é uma república, não respeita os
monarcas; em vez disso, como na Itália havia um um rei, talvez cobrassem menos.
Escreveram. Não demorou muito para receber uma resposta. O governo italiano
disse-lhes que enviariam de bom grado a máquina e o executor. A despesa total,
com a viagem incluída, seria de doze mil francos. Era mais barato; mas não deixava
de ser uma elevada quantia. Aquele canalha não valia tanto dinheiro. Cada habitante
teria de pagar quase dois francos de imposto.
O
conselho se reuniu novamente. Seus membros refletiram em como resolver o
imbróglio da maneira mais econômica possível. Talvez algum soldado quisesse decepar a cabeça
do criminoso, de um modo rudimentar. Chamaram o general.
—
Será que não haverá um soldado que queira decapitar o assassino? De qualquer
forma, quando vão para a guerra, matam; e é para matar que são ensinados.
O
general falou com seus soldados. Alguém quis cortar a cabeça do criminoso?
Todos eles recusaram.
—Não,
não sabemos fazer isto; não foi isto que nos ensinaram — disseram eles.
O
que fazer? Eles meditaram profundamente, nomearam um comitê, uma comissão e uma
subcomissão. Por fim, eles encontraram uma maneira de resolver a questão. A
pena de morte deveria ser comutada em prisão perpétua. Desta forma, o rei
mostraria sua misericórdia e ao mesmo tempo haveria menos despesas. O monarca
concordou; e eles resolveram adotar essa solução. Infelizmente, não havia prisão
especial onde encerrar o criminoso para o resto da vida. Havia pequenos
calabouços nos quais se encerravam temporariamente os culpados. Mas faltava uma
boa prisão. Finalmente, encontraram um lugar. Eles prenderam o criminoso e lhe
puseram um guardião.
Este
vigiava o criminoso e levava-lhe a comida da cozinha do palácio. Assim se
passaram doze meses. No final do ano, o príncipe fez o balanço das despesas e
receitas. E descobriu que o criminoso representava uma despesa considerável. Em
um ano, a sua comida e o salário do guardião somavam seiscentos francos.
O
criminoso era jovem e saudável; talvez ele ainda vivesse cinquenta anos. Não era
possível continuar assim. O príncipe chamou seus ministros:
—
Descubra uma maneira em que esse canalha nos custe menos dinheiro. Ele é caro
demais— disse.
Os
ministros se reuniram em conselho e meditaram por muito tempo. Um deles disse:
—
Senhores, creio que seja necessário suprimir o guardião.
—
O criminoso fugiria — respondeu outro.
—
Se ele fugir, pro inferno com ele!
Informaram
ao rei, que acolheu a proposta. Suprimiram guardião e esperaram para ver o que
aconteceria.
Na
hora de comer, o criminoso procurou o guardião; e, por não o encontrar, foi
pessoalmente à cozinha do palácio pedir comida. Pegou o que lhe deram, voltou
para a prisão e fechou a porta atrás de si. O prisioneiro saía em busca de comida, mas não
fugia.
O
que fazer? Consideraram que deveriam dizer ao prisioneiro que ele não servia para
nada, que podia partir. O Ministro da Justiça o chamou.
—
Por que você não vai embora? Ninguém o vigia. Você pode ir embora
tranquilamente. O príncipe não achará ruim.
—Mas
eu não tenho para onde ir. Para onde vocês querem que eu vá? Com a sentença,
cobriram-me de opróbrio. Agora, ninguém vai querer saber de mim. Sou um homem
segregado de meu meio. Vocês procedem injustamente comigo. Isto não se faz.
Primeiro, se me condenaram à morte, deveriam ter-me matado. E, embora não me tenham
executado, eu não protestei. Depois, fui
condenado à prisão perpétua e me puseram um guardião, que me trazia a comida;
mas não tardaram em dispensá-lo. Tampouco protestei. Fui pessoalmente buscar a
minha comida. Agora me dizem para ir embora. Mas, agora, resolvam-se como
quiserem. Não vou embora! — respondeu o criminoso.
Reuniram
novamente o conselho. O que fazer? Que solução tomar? O criminoso não ia embora.
Depois de muito pensar, eles decidiram atribuir-lhe uma pensão. Era a única
maneira de se livrar dele.
Eles
comunicaram a resolução ao príncipe.
—
O que mais podemos fazer? Isto tem que acabar! — disse o monarca.
Concederam
ao criminoso uma pensão anual de quinhentos francos e informaram-no disto.
—
Bem, se me pagarem pontualmente, eu vou-me embora.
E
assim se ajustaram as coisas. Eles deram ao criminoso um terço da pensão
antecipada. Ele se despediu de todos e abandonou os domínios do príncipe. Viajou
apenas quinze minutos de trem. Estabeleceu-se perto do principado, comprou um
terreno, fez uma horta e um jardim e vive muito feliz.
Em
datas determinadas, ele vai a Mônaco receber a pensão. Depois que a recebe, vai
para o cassino e aposta dois ou três francos. Às vezes ganha; outras, perde. E
volta para casa. Vive tranquilamente.
Ainda
bem que não delinquiu em um lugar onde não se medem gastos para decapitar um
homem nem para mantê-lo prisioneiro pela vida inteira.
Versão em português:
Paulo Soriano.
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