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A CONVERSÃO DE ABRAAM - Conto Clássico - Giovanni Boccaccio

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  A CONVERSÃO DE ABRAAM Giovanni Boccaccio (1313 – 1375) Tradução de Paulo Soriano   Em Paris havia um grande comerciante e homem de bem que se chamava Giannotto de Civigní, homem muito fiel e íntegro, e grande comerciante de tecidos. Tinha uma singular amizade com um judeu muito rico chamado Abraam, também comerciante, igualmente um homem muito honrado e leal. Vendo a honestidade e a fidelidade do amigo, pôs-se Giannotto a lamentar, profundamente, pela alma de um homem tão digno, sábio e bom, já que destinada à perdição, em razão da ausência de fé. Por isso, começou a suplicar-lhe que deixasse os erros da fé judaica e buscasse a verdade cristã, que ele via como santa e boa, sempre a prosperar e a aumentar, enquanto a do amigo, pelo contrário, estava a minguar e reduzir-se a nada. O judeu respondeu que acreditava que nada era santo ou bom, exceto a fé judaica, na qual nascera, e pretendia nela viver e morrer. Nem por isto, o amigo, passados alguns dias, deixou de insistir n

O DECRETO IMPERIAL - Conto - Kalaych

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  O DECRETO IMPERIAL Kalaych (Início do sec. XX)   Um dia — faz muitos anos —, enquanto o vento frio do Norte soprava entre as persianas do palácio da Cidade Proibida, sibilava por entre as decorações de laça e as pilastras de mármore e fazia ressoarem as campânulas de porcelana do teto, reuniu-se, na sala das audiências imperiais, o conselho de ministros. O vento, embora soprasse rijamente lá fora, não conseguia penetrar o interior da Grande Corte do Esplendor, porque pesados e riquíssimos brocardos e veludos fechavam as passagens e frinchas. O fumo erguia-se quase verticalmente dos tripés misturando-se, no alto, com as emanações de cinquenta braseiros de porcelana. O salão estava repleto de dignitários: manchus de cara feroz, chinos de compridos rabichos e, aos lados de ampla cortina, guerreiros da primeira das Oito Bandeiras, metidos em armaduras lavradas. Súbito, o Filho do Céu apareceu. E todos caíram de joelhos, tocando o chão com a testa, ao mesmo tempo que se ouvi

PROTESILAU E LAODÂMIA - Breve Narrativa Clássica Trágica - Caio Júlio Higino

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  PROSESILAU E LAODÂMIA Caio Júlio Higino (c. 64 a.C. – 17 d.C.)   Protesilau   Um oráculo advertiu os aqueus de que primeiro homem que chegasse à costa de Tróia morreria. Quando a frota grega se aproximou da costa, tendo os demais navios se atrasado, Iolau, filho de Íficio e Diomédia, foi o primeiro a saltar de sua nau, mas foi imediatamente morto por Heitor. Todos o chamavam de Protesilau, pois ele foi o primeiro grego a morrer em Tróia. Quando sua esposa Laodâmia, filha de Acastus, soube que ele havia morrido, chorou e implorou aos deuses para que pudesse falar com ele por três horas. O seu desejo foi concedido, e quando Mercúrio o trouxe, por três horas ela falou com o marido. Mas quando Protesilau pereceu pela segunda vez, Laodâmia não pôde suportar sua dor.   Laodâmia   Laodâmia, filha de Acasto, havia perdido seu marido e estava constantemente chorando e se lamentando. Assim, ela mandou fazer uma estátua de bronze, que representava fielmente seu marido,

A VERDADE E A MENTIRA - Conto Tradicional Judaico

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  A VERDADE E A MENTIRA (Conto tradicional judaico)   Diz a lenda que, certo dia, a Verdade e a Mentira se encontraram. — Bom dia — disse a Mentira. — Bom dia —respondeu a Verdade. — Faz um belo dia — continuou a Mentira. A Verdade, então, cuidou de verificar a certeza daquela afirmação. E viu que era certo o que dissera a Mentira. —Faz um dia lindo —respondeu a Verdade. — O lago está ainda mais bonito! — disse a Mentira, com um sorriso encantador. A Verdade olhou para o lago e viu que a Mentira estava certa. Concordou com a cabeça. A Mentira correu para a água e disse: — A água está maravilhosa e bem quente. Vamos dar um mergulho! A Verdade tocou na água com os dedos. Estava mesmo maravilhosa e quentinha. Por tudo isto, a Verdade confiou na mentira.  Tiraram ambas as suas vestes e nadaram tranquilamente. Um pouco mais tarde, a Mentira saiu, vestiu sorrateiramente a roupa da Verdade e foi-se embora. A Verdade, não podendo vestir a roupa da Mentira, pôs-se a vagar despida. Todos, a part

O TALHER ENCANTADO - Conto Breve - Anônimo do séc. XIX

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  O TALHER ENCANTADO Anônimo do séc. XIX   Era costume, entre as famílias ricas estrangeiras, receber à sua mesa, em certos dias do ano, correligionários pobres. Um banqueiro dava um jantar nestas condições, achando-se à mesa dois compatriotas pobres. Um destes, que vigiava o seu camarada, viu que ele acabava de esconder em uma das botas um talher de prata de alto valor. Isto prejudicava-o bastante, porque ele tivera precisamente a ideia de fazer o mesmo com o seu. No momento em que se iam levantar na mesa, toma a palavra: — Meus senhores — diz ele, dirigindo-se aos donos da casa —, permitiam-me, em sinal de reconhecimento, que faça uma pequena sorte de escamoteação que divertirá muito esta bela sociedade.   — Muito bem! — disseram os convivas. — Veem este talher de prata? Bem. Eu coloco-o nas minhas botas. Viram bem, não? — Sim! —Pois bem! Schoumli! Schoumlá? Passa! Passou. E fez com o braço um gesto rápido. —O talher passou para as botas daquele senhor! Verifi

OGUSTO - Crônica - Paulo Soriano

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  OGUSTO (OU CRÔNICA DE UM NATAL COMUM) Paulo Soriano     Para Henry Evaristo, in memoriam.   – Moço, o senhor me paga um almoço pra mim? É comum que os pequenos, ao abordarem na rua as pessoas, estendam as mãos e peçam baixinho, teatralizando um olhar humilde e piedoso. Não foi assim com aquele garoto mulato, de belos olhos cor-de-avelã. Tinha um sorriso bonito no rosto e parecia especialmente feliz. – Como é o seu nome? – Ogusto. – Venha, Ogusto. O homem, que achou graça naquele menino raquítico, de alvos dentes e olhar esperto, caminhava em direção ao shopping . O menino tocou-o sutilmente no cotovelo quando se aproximavam de um dos portões de entrada: – Me dê a mão, moço, senão os segurança me barra. O homem obedeceu. Olhou para o menino, que sorria radiante, e sentiu uma ternura inocente — e um certo orgulho indefinido —, algo que o pai deveria sentir quando leva o filho para passear em um fim de semana ensolarado. – Qual é o seu time, Ogusto? – pergunt

O CONTO DO VIGÁRIO - Crônica Clássica - Mário José de Almeida

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  O CONTO DO VIGÁRIO Mário José de Almeida (Início do séc.   XX)   Inácio José Pereira Maranhense, ainda pouco conhecido como vigarista, frequentava uma roda em que havia um homem que gostava de usar joias.   Uma tarde, ele surgiu casualmente no café em que costumavam se encontrar para palestras descuidadas e trazia no dedo um anel de ouro com um autêntico brilhante. A joia despertou a atenção e passou de mão em mão, porque o Maranhense, com muita naturalidade, tirou-a do dedo e colocou-a sobre a mesa.   —Quanto vale, Maranhense? —Não vale nada. É apenas um trabalho bem feito. —Mas é de ouro?   —Não. O aro é de plaquet e essa pedra é um brilhante de Paris. — Qual, eu conheço joias — disse o homem, que costumava usá-las. E continuou: — Esse anel é verdadeiro e, se você quiser, dou 500$000 por ele. —Você está doido. Isto vale uns 20$000, quando muito. E encaminhou a conversa para outro assunto. No dia seguinte surgiu o Maranhense com o mesmo anel no dedo. Com