O OLHO DE VIDRO - Conto - Oscar Wilde
O
OLHO DE VIDRO
Oscar
Wilde
Certo
ricaço, vítima de um ligeiro acidente de caça, ficou caolho. Mandou fazer um
olho de vidro especial, um olho admirável e perfeito, em todo sentido digno de
sua fortuna.
O
cristal mais puro e o esmalte mais fino faziam dele uma pequena obra de arte.
Na água verde de sua pupila cintilavam chispas de ouro e a íris parecia
profunda, viva e real.
O caolho experimentou-o diante do espelho e se
sentiu tão satisfeito que quase se apaixonou por si mesmo. Quis consultar seu
melhor amigo:
—E
então, perguntou-lhe, que achas de meu olho de vidro?
O
amigo respondeu sem entusiasmo:
—É
indiscutivelmente o melhor que se pode fabricar.
—
Como? Não te sentes maravilhado? Não achas que seja a própria vida? Quanto a
mim, estou tão surpreendido que mal posso distinguir o falso do verdadeiro.
Olha bem, olha bem e dize-me se vês qual é o artificial.
—É
este, respondeu o amigo sem vacilar.
—E
como o adivinhaste?
—É
o mais bonito.
—Ah,
estás agindo de má-fé! Isso é porque o sabias! Mas façamos uma prova. Vem
comigo à rua.
Saem
os dois amigos e o ricaço avista, perto de sua casa, apoiado num muro, um
mendigo que treme de frio.
—Amigo,
diz-lhe, queres ganhar uma coroa?
—Uma
coroa! — exclama o pobre. —Bem que o quero. Há dois dias que não como e
me faz muita falta!
Franzindo
o cenho, o rico instala-se diante do árbitro, colocando-lhe na mão uma moeda de
prata.
—
Olha, examina com calma. Sou caolho. Dize-me: qual dos meus olhos é o de vidro?
O
mendigo, vacilando tão pouco quanto o amigo tinha vacilado, diz num instante:
—
É este.
—
Isso é surpreendente! E como o adivinhaste?
—
É muito simples, senhor — respondeu o pobre esfarrapado. — Foi o único no qual vi
um pouco de piedade.
Texto reconstituído por M. Guillot de Saix
Fonte: Carioca, de 6 de
janeiro de 1945
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