A ÓRFÃ DAS PRISÕES - Narrativa Verídica - Autor anônimo do séc. XIX
A ÓRFÃ DAS PRISÕES
Autor anônimo do séc. XIX
No tempo do terror, habitava em Paris a princesa Fanny Lubomirska1, tão ilustre pelo seu nascimento como pela sua beleza; entregue unicamente ao cuidado de educar Rosália2, sua filha única, então de cinco anos de idade, ela se julgava protegida pelas leis sagradas do direito das gentes; mas, denunciada ao comitê revolucionário como conspiradora contra a republica, foi apresentada perante o tribunal; dentro de poucos dias foi condenada à morte.
Quando estava na prisão, tinha consigo sua filha. No dia que esta desgraçada mãe foi levada ao cadafalso, recomendou Rosália às suas companheiras de infortúnio; mas estas, tendo sofrido a mesma sorte, deixaram Rosália a outras, e assim, transmitida de vítima em vítima, foi adotada pela lavadeira da cadeia. Esta mulher, compadecida pelo desamparo da pobre criança, ajuntou este sexto filho aos cinco de que era mãe, e veio a ser a providência da órfã das prisões.
Ainda que se achasse em uma posição muito diferente daquela para que tinha sido educada, Rosália ajudava com zelo do seu trabalho a sua benfeitora; e por este motivo a confundia sua mãe adotiva com os outros filhos.
Mudaram as circunstancias que tinham exigido tão grande terror, e a lista das vítimas, publicada por toda a Europa, anunciara aos amigos da princesa polaca que ela tinha pago caro a sua imprudência. Apenas recebeu esta notícia, o conde de Regewouski1, irmão da princesa, veio logo a Paris. Auxiliado pelas autoridades, ocupava-se sem descanso em descobrir os vestígios da filha de sua desgraçada irmã: tinha usado de todos os meios, anúncios, cartazes; mas tudo tinha sido baldado. O carcereiro da cadeia, o único que podia dar algumas informações, tinha morrido.... Todavia, a Providencia fez que a antiga lavadeira da cadeia fosse então lavadeira da hospedaria em que estava o conde.
Um dia que Rosalia veio acompanhar sua mãe à hospedaria, o conde, que a viu passar pela porta do seu quarto, admirado pela sua beleza, e pensando descobrir nele as feições da sua irmã, a chamou e lhe disse:
—Como te chamas?
—Chamo-me Rosália.
— É tua filha? — perguntou o conde à lavadeira.
Aquela lhe respondeu que sim, que a tratava como tal, mas que outra pessoa lhe tinha dado origem.
—Esta menina — terminou ela —, é filha de uma senhora que estava presa.
—Presa, dizes tu? — replicou o conde, que logo desconfiou ler achado sua sobrinha. E para se convencer disso, falou-lhe a língua do seu pais.
Rosália conheceu logo os acentos da língua na qual sua mãe a educara; e o conde, inteiramente satisfeito, exclamou:
— Rosália, minha Rosália, és minha sobrinha; és filha da minha adorada irmã.
Depois, voltando-se para a lavadeira:
— Excelente mulher — disse-lhe ele —, serás sempre sua mãe; nunca a haverás de deixar, já que a pobre órfã abandonada foi tanto tempo de vossa família; pertencerás agora à dela.
Proferindo estas palavras, deu-lhe uma bolsa cheia de dinheiro e a obrigou a vir, nesse mesmo dia, habitar com suas filhas na hospedaria.
Pouco tempo depois, voltaram para a Polônia e a lavadeira acompanhou sempre Rosália. Os filhos da lavadeira foram educados à vista do conde e com todo o desvelo. Os que eram rapazes foram para universidade de Wilne e entraram depois para o exército, onde vieram a ser ajudantes do príncipe Poniatowski; as filhas foram magnificamente dotadas e casaram com ricos cavalheiros.
Rosália casou com um filho do conde, e nunca deixou a sua querida benfeitora e amiga, à qual chamava sua mãe.
Fonte: “Correio das Modas”/RJ, edição de 19 de novembro de 1840 e “Museo Universal”/RJ, edição de 17 de junho de 1843.
Notas:
1Na verdade, Rozalia Lubomirska (Chemobil, 16 de setembro de 1768 – Paris, 30 de junho de 1794).
2Rozalia Alexandra Lubomirska (Paris, 3 de setembro de 1788 – Varsóvia, 15 de janeiro de 1865) era filha do duque Josef Alexander Libominski e Rozalia Lubominska).
3Alexander Francis Hodkevich (1776 – 1838).
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