UMA HERANÇA FATAL - Conto - Wilkie Collins
UMA HERANÇA FATAL
Wilkie Collins
1824 – 1889
Tradução de autor anônimo do séc. XIX
Faz pouco mais do três meses, Alicia, que, em formosa manhã, passeavas com teu irmão pelo Hyde Park. Era dia de calor e tu e ele deixáveis os cavalos irem a passo; momentos depois, passáveis junto à grade do lado direito, cerca do extremo do leste do lago do jardim, sem notar uma humilde mulher que passeava só e tranquilamente pela calçada, observando os cavaleiros que por ali transitavam.
Aquela mulher fora a minha aia, Nancy Connell. Logo que lentamente passaste junto dela, teu irmão deixou-lhe ouvir estas palavras a ti dirigidas:
— Será realmente certo que Mary Brading e seu marido tivessem partido para a América?
Tu te riste—como se a pergunta te divertisse muito—e respondeste:
—É a pura verdade. Partiram.
—Que tempo ficarão ausentes? — perguntou de novo teu irmão.
—Toda a vida, provavelmente — disseste tu, rindo-te outra vez.
Já tu e teu irmão vos tínheis adiantado de Clara, quando esta teve de apressar o passo para alcançar-vos, escutando a conversação, para o que chegou a colocar-se muito próximo de teu irmão que, bastante surpreendido com as tuas respostas, exclamou com gravidade:
— Deixarem a Inglaterra e estabelecerem-se na América! Por que o teriam feito?
—Quem pôde sabê-lo? O marido de Mary está louco e ela não o está menos!
Tocaste teu cavalo com o chicote e num instante tu e teu irmão vos acháveis longe dos ouvidos da minha aia, a qual me comunicou em uma carta recente tudo que acabo de escrever-te.
Essas tuas palavras me têm feito pensar, durante horas inteiras, mais intensamente do que o podes supor, a determinar-me até a tomar a pena em defesa minha e de meu marido, contando-te a história do nosso casamento e o motivo de nossa emigração para os Estados Unidos da América.
Pouco nos importa, a ele ou a mim, que nossos amigos de Inglaterra nos tenham por loucos ou não; a opinião destes, hostil ou favorável, carece inteiramente de importância a nossos olhos. Porém, tu eras uma exceção à regra. Em tempos passados, fomos íntimas e carinhosas amigas no colégio; e — o que eu considero ainda de maior valor — minha mãe te estimava e te considerava cordialmente, e, em seu mesmo leito de morte, teve doces palavras para ti. Durante estes últimos anos, a sorte nos tem trazido separadas; mas que queres? Não posso esquecer-me daqueles tempos, nem tampouco ser indiferente à tua opinião a meu respeito e de meu marido, ainda que um oceano nos separe e nunca mais possamos ver-nos. Penso que é loucura minha tomar tanto a peito o que podias ter dito, sem pensar, em um instante de frivolidade; porém, posso apresentar, como escusa, que tenho tido momentos bastante amargurosos na minha vida e que hei sido sempre, como te lembrarás, de temperamento mui susceptível, tão dado a excitar-se como a abater-se. Basta sobre o particular. Agora me farás o último favor que tenho de pedir-te. Lê o que segue e julga depois, por ti mesma, se meu marido e eu somos tão loucos como parecias crê-lo quando Nancy te ouviu conversar com teu irmão em Hyde Park.
CAPÍTULO II
Fazia uma semana que me achava com meu pai e meu irmão James em Eastbourne, na costa de Sussex.
Meu irmão parecia estar completamente restabelecido dos efeitos de uma queda em certa caçada; contudo, às vezes se queixava de dores de cabeça. O médico nos aconselhou que experimentássemos o ar da maré e nos dirigimos a este ponto sem suspeitar das consequências do golpe que meu irmão recebeu. Nos primeiros dias tudo correu bem. O lugar nos agradou, o ar nos fez bem e até determinamos prolongar nossa estada ali durante algumas semanas mais.
No sexto dia — dia memorável para mim por motivos que mais adiante saberás —, meu irmão queixou-se de novo da sua antiga dor de cabeça. Saímos juntos a caminhar para ver se o exercício o aliviava alguma coisa. Passamos por todo o povoado até o forte que está em um de seus extremos e seguimos por um caminho orlado pelo mar, cheio, de um e doutro lado, de fragmentos de madeira de telhar, terminando na estrada que conduz a Hastings. Fazia alguns momentos que tínhamos deixado atrás o forte; eu ia caminhando adiante e James me seguia pacificamente e me falando como de ordinário; mas, de repente, se deteve, deixando sem terminar a frase que me dirigia. Voltei-me, atônita e surpreendida, e o vi prostrado no chão, sem sentidos, vítima de terríveis convulsões.
Era o primeiro ataque epiléptico que via em minha vida; perdi toda a presença do espírito; a única coisa que pude fazer foi juntar, horrorizada, as minhas mãos e gritar, pedindo socorro.
Ninguém aparecia naquela solitária paragem: pensei que estivéssemos demasiadamente longe para que alguém pudesse ouvir-me; no fim de minha incessante inquietação, divisei, consolada, distante, um homem que corria para mim. Ao aproximar-se, conheci que era um cavalheiro, jovem e cheio de boa vontade de auxiliar-me.
—Acalme-se, acalme-se — disse-me, depois de lançar um olhar sobre meu irmão. —É um espetáculo bem triste, sem dúvida; não há, porém, nenhum perigo. Temos que esperar algum tempo, a fim do que cedam as convulsões e, então, eu o ajudarei.
Falava com tanta segurança que o tomei por um médico e claramente lhe interroguei se o era.
Ele enrubesceu um pouco e pareceu muito confundido com a minha pergunta.
—Não sou médico — me disse. — Porém, hei tido mais de uma oportunidade de ver pessoas que sofrendo de epilepsia e tenho ouvido dizerem os médicos que é inteiramente inútil intervir durante o ataque. Veja — continuou —, seu irmão está mais tranquilo; dentro um breve começará a sentir-se aliviado e o ajudarei então a chegar até o forte; uma vez ali, veremos uma carruagem que o conduza à sua casa.
Cinco minutos depois, estávamos em caminho para o forte; o desconhecido sustinha a meu irmão com tanto carinho e solicitude como se fosse um antigo amigo; obtivemos uma carruagem e ele insistiu em acompanhar-nos até a porta de nossa casa, dizendo talvez nos fosse necessário; acedi a seus desejos e, ao despedir-se, pediu permissão para vir saber, no dia seguinte, do estado de James. Jamais vi homem tão modesto, amável e sem pretensões como aquele cavalheiro, chegando por sua conduta não só á inspirar-me a mais profunda gratidão, como também a despertar em mim grande interesse por ele.
No dia seguinte veio fazer a visita prometida; seu cartão nos fez saber seu nome, Roland Cameron. Meu pai, que é homem difícil de seduzir, simpatizou com ele à primeira vista; a instâncias nossas dilatou sua visita e, a respeito de si, disse unicamente o necessário para fazer-nos saber que recebíamos a um, quando menos, de posição igual à nossa. Era natural de Inglaterra, de família escocesa, havia perdido seus pais e herdado, fazia pouco tempo, uma grande fortuna de um de seus tios; não deixou de chamar nossa atenção o acento melancólico de sua voz ao falar de sua riqueza, assunto que era, indubitavelmente, por motivos que ignoramos, desagradável para ele; apesar de ser rico, manifestou que levava uma vida simples e solitária: gostava pouco da sociedade e quase nada da dos jovens da sua idade; tinha, em compensação, algumas inocentes ocupações, e os sofrimentos passados o haviam ensinado a não esperar muito da vida. Tudo isto dito com extremada modéstia e de uma maneira tão suave e voz tão doce que me impressionaram sobremaneira. Seu aspecto contribuía a aumentar o bom efeito que sua conversação produzia. Era de mediana estatura; delgado, porém forte; pálido, tendo mãos e pés pequenos e bem feitos; seus cabelos eram castanhos e crespos naturalmente; os olhos grandes e escuros com certa indecisão ocasional, em expressão que me parecia corresponder com certa indecisão, também ocasional, ao seu modo de falar, harmonia que mais era uma graça que um defeito, e indecisões que provinham, em meu conceito, de confusão passageira em suas ideias que, não sem pequeno esforço, vencia e dominava. Acaso te surpreende, querida Alicia, a minuciosa observação que fiz de um homem que me era estranho, em nossa primeira entrevista? Ou já se despertam as tuas suspeitas e dizes: namorou-se de Roland Cameron desde que o viu pela primeira vez?
Posso alegar em minha defesa que não era eu tão extremamente romântica para ir nesse passo. Porém, confesso que aguardei sua próxima visita com uma impaciência jamais experimentada antes no decurso de minha vida aprazível; e, o que é mais, o dia em que Roland devia voltar, mudei três vezes de vestidos antes de ver satisfeita minha nascente vaidade ao examinar-me diante do espelho. Quinze dias depois, meu pai e meu irmão começaram a considerar a sociedade do nosso novo amigo como um costume agradável contraído por eles e, outros quinze dias mais tarde, Roland eu, sem que ousássemos comunicar um ao outro, nos amávamos já com todo o entusiasmo de nossa juventude. Ah! Que tempo tão feliz, e como cedo chegou o fim de nossa mútua ventura!
Durante o breve tempo que te hei descrito, notei em Roland Cameron certas peculiaridades que, em realidade, perturbavam e inquietavam meu ânimo, quando, em minhas horas de soledade, me punha a pensar nele.
Por exemplo, às vezes deixava-se ficar largos momentos em silêncio quando mais animados nos achávamos em nossa conversação; então, seus olhos lançavam uns tristes e vagos olhares e sua mente parecia absorta em ideias estranhas, inteiramente alheias às nossas palavras e a mim; e pior era que não tinha consciência dessas distrações e que insensivelmente caía nelas e delas saía. Se lhe dizia que não me estava prestando atenção, ou se lhe perguntava porque permanecia calado, se surpreendia e se inquietava, ingênua e notavelmente. O que assim o preocupava era um profundo mistério para mim. Seu rosto, em circunstâncias normais móvel expressivo, empalidecia completamente. Era que acaso havia sofrido alguma dor moral em alguma época de sua vida e de que, todavia, não se via livre seu espírito? Ansiava por perguntar-lhe, e, sem embargo, não me atrevia a fazê-lo, porque me seria bem desagradável ocasionar-lhe um pesar, ou para dizê-lo sem rodeios, porque me sentia profunda e ternamente inclinada para ele.
Outras vezes, ainda que de ordinário era homem sumamente lhano e cortês, se irritava violentamente pelas coisas as mais frívolas: um cão que ladrasse, um rapaz que atirasse pedras na rua, ou um vendedor importuno que quisesse fazê-lo comprar suas mercadorias, qualquer destas coisas o incomodava a um extremo tal que, em realidade, espantava vê-lo.
Está sabido que, depois sempre destes assomos de frenesi, pedia mil perdões pelo que acabara de dizer ou fazer, e com um modo tão delicado e com acento tão sincero, que revelava às claras o quanto se arrependia daquilo. Porém, nunca chegou a poder dominar-se completamente. Estava naquelas ocasiões inteiramente à mercê destes fenômenos nervosos.
Outro rasgo das peculiaridades de Roland, e concluo o assunto. Quando se achava conosco à noite, bem que houvesse vindo jantar ou tomar somente chá, se despedia e se retirava invariavelmente às nove horas. Às vezes, insistíamos para que permanecesse algum tempo mais; ele, porém, urbana, ainda que firmemente, não acedia ao pedido; minha influência para com ele não se estendia até isto. Quando carinhosamente lhe suplicava que não se fosse embora, ainda que não me atendendo, revelasse que sofria moralmente, partia à exata hora do costume, nem um minuto antes nem depois. Nunca nos havia dado explicação de tão estranho proceder; se limitava a dizer-nos que era hábito, suplicando-nos que o respeitássemos sem novas perguntas e inúteis insistências. Meu pai e meu irmão lograram, como homens, dominar a curiosidade que isto lhes inspirara; porém eu, como mulher, e muito mais interessada que eles em tudo que se referisse a Roland, me sentia cada vez mais e mais ansiosa de saber este mistério, e, finalmente, determinei-me a aproveitar, à primeira oportunidade que se me apresentasse, a esperar um dos momentos de melhor ânimo de Roland e pedir-lhe, como favor especial, que me revelasse a chave do seu segredo, saindo de dúvidas por uma vez.
Dois dias depois se me apresentou o ensejo que desejava.
Havíamos determinado passar um dia no campo em companhia de vários amigos nossos e o lugar escolhido era junto à famosa rocha chamada Beachey Head. O dia designado esteve formosíssimo e o jantar que tivemos, sem as formalidades e etiquetas do costume, foi muito mais agradável e infinitamente preferível, ao menos para essa vez no ano, ao de todos os outros dias, sempre ordenado e cheio de cerimônias. Ao cair da tarde, nos separamos em distintos grupos de duas ou três pessoas para explorarmos as imediações. Roland e eu, não sei como, nos achamos juntos. Sentamo-nos felizes e estávamos sós. Era o momento oportuno ou inoportuno para fazer a fatal pergunta Não sei: a única coisa que posso dizer-te, Alicia, é que a fiz.
CAPÍTULO III
—Roland — disse eu —, terás desculpas que conceder a uma pobre mulher, e quererás dizer-me o que estou morrendo por saber?
Caiu direitamente no laço, com essa ausência completa de malícia rápida, ou de ligeira suspeita, como queiras chamá-la, que é tão comum nos homens, como raro nas mulheres.
—Sem dúvida que sim —respondeu-me.
—Pois bem, então por que te retiras sempre às nove horas?
Ele recuou um pouco surpreendido e me olhou com tal expressão de amargura e reconvenção que houvera dado tudo o que possuía para recolher as palavras imprudentes que acabava do pronunciar.
—Se acedo em responder-te — murmurou, depois de um momento do luta consigo mesmo —, permitir-me-ás antes que eu, à minha vez, te faça uma pergunta e prometo respondê-la com inteira franqueza?
Prometi-lhe sem vacilar e esperei ansiosa o que surgiria dali.
—Mary, fala-me sinceramente, acreditas que eu esteja louco?
A tal pergunta não era possível responder com uma gargalhada, porque ele falou seriamente. Com toda a circunspecção, disse-lhe:
—Jamais hei abrigado semelhante ideia.
Ele encarou-me fixamente.
—Dá-me tua palavra de honra?
—Sim; palavra de honra.
Minha resposta foi sincera e indubitavelmente o meu tom de verdade lhe agradou.
Tomou-me a mão e, agradecido, a levou a seus lábios.
— Obrigado — disse-me —, obrigado. —Animas-me a contar-te uma dolorosa história.
—Que história? —perguntei.
—A minha. Permita-me dizer-te a causa por que persisto em retirar-me de tua casa sempre à mesma hora. Cada vez que saio, estou obrigado, por uma formal promessa feita à pessoa com quem vivo em Eastbourne, a estar de volta às nove horas e um quarto
—A pessoa com quem vive! — exclamei. —Pois quê! Não vive num hotel?
—Vivo, Mary, debaixo do cuidado de um doutor que tem um asilo de loucos. Ele tomou uma casa à beira do mar para seus pacientes ricos; deixa-me em completa liberdade durante o dia; porém, com a condição de que à noite hei de cumprir rigorosamente a minha promessa. Tua casa está somente quinze minutos distante do asilo, e é esta uma regra invariável que todos os pacientes se hão de recolher às nove e meia.
Eis aqui revelado o mistério que tão penosamente impressionada me trazia! Ah! Porém, que direi da sua revelação? Se antes de descobrir este triste segredo estava angustiada, ao conhecê-lo quase que caí sem sentidos! Sem consciência já do que fazia, instintivamente, retrocedi uns passos. Roland fixou então seus melancólicos olhos em mim com um olhar cheio de súplicas.
—Não fuja de mim! — exclamou. — Não creia que eu seja um louco!
Eu estava demasiadamente confusa e abatida para saber o que dizer, e, ao mesmo tempo, o amava muito para permanecer surda às suas palavras. Tomei suas mãos e as apertei em silêncio; ele voltou para um lado a cabeça por um momento; porém, eu havia surpreendido uma lágrima em seus olhos; suas mãos tremiam nervosamente entre as minhas. Com resolução varonil, dominou-se em breves instantes, e, ao olhar-me de novo, pôde falar com a serenidade e compostura ordinárias.
—Importas-te ainda saber a minha história depois do que acabo de manifestar-te?
—Anseio escutá-lo — respondi-lhe. — Não imagina o que sinto por ti; acho-me muito abatida para exprimi-lo com palavras.
—É a mais terna e a mais amada das mulheres — disse, cheio de fervor e respeito.
Sentamo-nos juntos na musgosa extremidade de uma rocha, com nossos rostos voltados para o imenso oceano que unicamente tínhamos por testemunha, e morreram as últimas luzes do dia logo que acabei de ouvir a história cuja narração me converteu em esposa de Roland Cameron.
CAPÍTULO IV
—Minha mãe morreu quando eu era ainda uma criança, de poucos meses — disse. — Meu pai, segundo as vagas e primeiras lembranças que dele conservo, foi sempre para comigo duro e cruel. Se me tem dito que eu era sumamente caprichoso e tenaz em minhas inclinações e de difícil manejo; que sei eu!? O certo é que meu pai detestava tudo o que não tinha uma fisionomia, uma tendência ou um carácter especial e fixo — qualquer coisa que se apartasse de certo modo da rotina da sua monótona vida; era sumamente metódico; para tudo tinha uma hora e uma regra; era uma máquina e determinou que seu filho devia ser como ele. Na escola primeiro, e depois no colégio, fui sempre objeto de uma disciplina e de uma vigilância fatigantes; na realidade, quando me lembro e examino a primeira época de minha vida, não acho nada que se assemelhe a isso que se chama felicidade; para mim, nunca houve carícias, nem simpatias; amarga e estrita submissão a um severo destino, triste caminhante por desolada senda, é o resumo da minha existência desde os dez até aos vinte anos.
Uma vez, passei as férias do outono nos lagos de Cumberland e, ali, acidentalmente, me relacionei com uma moça francesa. Esse encontro fatal decidiu de todo o meu futuro. Ela desempenhava o cargo de instrutora em uma rica família inglesa. Víamo-nos frequentemente e eram nossas entrevistas origem de doce e inocente prazer para ambos. Carecia ela da experiência da vida tanto como eu, e havia entre nós uma perfeita harmonia de ideias e sentimentos. Nós nos amávamos ou, ao menos, assim o críamos. Eu não tinha ainda vinte e um anos nem ela dezoito quando lhe propus que fosse minha mulher.
Hoje compreendo toda minha loucura de então e me acuso dela, ou me lamento, conforme está o meu ânimo. E, sem embargo, não posso senão condoer-me de mim mesmo ao recordar aqueles dias! Eu era tão moço, estava tão ansioso de merecer de alguém um pouco de simpatia, de pôr um fim àquela vida vazia e solitária! Vida que com todas as suas tristezas devia, pouco depois, parecer-me serena e desejável.
O chefe da família em que trabalhava a instrutora descobriu nossos amores por meio de sua esposa e comunicou tudo imediatamente a meu pai. Este não teve senão uma única insistência, que foi que eu saísse logo e logo do Reino Unido, comprometendo-se a regular meu absurdo compromisso durante minha ausência! Respondi-lhe que me faltavam muitos poucos meses para ser maior de idade e que estava resolvido a cumprir a minha palavra dada àquela infeliz rapariga. Meu pai deu-me três dias para que eu pensasse. Mantive-me firme na minha resolução. Uma semana depois, fui declarado louco por dois miseráveis médicos e colocado, como tal, por meu pai em um asilo. Oh! Era acaso um ato de loucura o filho de um cavalheiro, que tinha diante de si um porvir esplêndido propor-se em casamento a uma instrutora?
Três anos permaneci naquele funesto asilo. O diretor, informado oficialmente, no fim deste tempo, que os ares do lugar me prejudicavam, enviou-me a outro, em que fiquei dois anos mais, em um lugar remoto da Inglaterra. Assim é que os melhores cinco anos de minha vida os hei passado encerrado entre uma turba de dementes; e, sem embargo, minha razão há resistido. Por que, se me figura que a impressão produzida em ti, em teu pai, em teu irmão, e em outros indivíduos que nos hão acompanhado este dia ao campo, é que meu juízo é tao firme e são, como da generalidade dos homens, ou acaso me aventuro a assegurar que tenho sido um homem que desfruta do uma razão completa? Ao fim destes cinco anos de arbitrária clausura em um país que se diz livre, afortunadamente para mim—me envergonho de dizê-lo, porém prometi dizer-te toda a verdade—, afortunadamente para mim morreu meu implacável pai. Seus testamenteiros, a quem fui recomendado, se apiedaram de mim e, sem quererem contrair a responsabilidade de me concederem uma ilimitada liberdade, me colocaram sob a guarda de um médico que me admitiu em sua casa particular e me permitiu fazer exercício ao ar livre sem mortificantes restrições.
Um ano de prova deste gênero de vida satisfez ao médico, e satisfaria a qualquer indivíduo que sentisse por mim algum interesse. E fez-lhe ver que me achava em estado de dispôr de minha independência e ser dono de mim mesmo. Permitiu-me, então, residir com um de meus parentes cerca das imediações daquele mesmo lago que havia sido, seis anos antes, o cenário dos meus amores com a pobre francesa.
CAPÍTULO V
Minha nova vida naquele lugar deslizou tranquila, entretida nas ocupações ordinárias do campo. O tempo me havia curado, desde muito antes, daquela inclinação juvenil para com a bela instrutora. Visitava sem emoção os lugares em que juntos havíamos estado, e passeava inalterável pelo mesmo lago em que, unidos, tínhamos sulcado em noites de luar. Soube um dia que se havia casado em seu país, e os mil votos que fiz pela sua felicidade foram tão sinceros como puderam fazê-los o mais desinteressado de seus amigos. Aquele amor precoce, a que tanto havia sacrificado, e de tão terríveis consequências para mim, aparecia ante meus olhos, com suas cores verdadeiras, como passageiro entretimento de um rapaz e nada mais.
Assim correram três anos de liberdade, que mil testemunhos podia apresentar, jamais abusei. Porém, este largo o feliz intervalo, como todos os intervalos, teve um fim, e, então, apareceu em todo o seu funesto rigor a calamidade maior da minha vida. Morreu um do meus tios, deixando-me por herdeiro único de sua imensa fortuna. Eu, só, devia, com exclusão de todos os outros parentes, receber, das pingues rendas de suas terras, mais de 70.000 libras esterlinas em efetivo. Herança fatal! A vil calúnia de que se me havia feito vítima, acusando-me de louco, devia ser renovada do novo por miseráveis que tinham interesse em colocarem-se entre minha herança e mim! E assim foi. Faz um ano que me enviaram de novo ao ultimo asilo em que estive encarcerado. O pretexto de então foram ‘uns atos de violência’, como diziam, que eu havia cometido em momentos de cólera; atos que nunca tiveram a menor importância. Uma vez, já no asilo, os conspiradores trabalharam por completar sua obra. Nomeou-se uma comissão de exame contra mim, comissão que constava de um só indivíduo. Esse homem, sem levar-me ante um tribunal e sem facilitar-me um advogado que me defendesse, declarou que eu tinha perdido o juízo. O cuidado de minha pessoa, assim como o da administração de meus bens, foram confiados a homens escolhidos e designados por aqueles que me haviam acusado de loucura; e aqui estou, graças à bondade do dono do asilo, que me permitiu este dia de recreio, e que me confiou minha liberdade, como vês. Tenho escassamente trinta anos, e me vejo despojado do uso do meu dinheiro e da administração do meus bens. Trinta anos, apenas, e declarado louco incurável!
CAPÍTULO VI
Nesse ponto, Roland se deteve e deixou cair a cabeça sobre o peito. Sua história estava relatada. Tenho te repetido suas palavras, Alicia, com tanta exatidão quanto é possível; porém, não posso dar-te uma ideia, sequer remota, da modesta e comovedora resignação com que falou. Dizer-te que me compadeci dele, de todo o meu coração, seria não dizer-te nada. Amava-o e conheci então que era com toda a minh'alma.
—Oh, Roland! — disse, logo que achei ocasião de falar. — Não existe ninguém que possa socorrer-te? Não há esperanças?
—Sempre há esperanças! — respondeu, sem levantar a cabeça. —E permite que te dê graças por haver-me feito saber.
—E eu me alegro de ouvir-te falar nestes termos. Porém, por que dizes que te hei ensinado a esperar?
—Tu… Ah, Mary, tu tens sido o único astro que há brilhado na noite tétrica da minha vida! Quando estou a teu lado, fogem de mim todas as minhas amargas recordações, torno a ser um homem feliz, espero sempre! Sonho haver encontrado o que nunca hei tido, uma amiga leal e querida que desperte minha passada energia adormecida debaixo de tantos infortúnios! Ah! Por que julgas que me submeti à perda de meus direitos e de minha liberdade sem fazer um poderoso esforço para recobrá-los? Porque me via só, inteiramente só no mundo, até que te encontrei; porque não havia mão que me ajudasse a levantar-me, nem soava uma voz que me animasse a intentar um esforço. Tenho encontrado essa mão generosa? Tenho ouvido esse acento vigorizador? Quando estou a teu lado, essa esperança que me ensinaste a ter, me diz “sim”; porém, quando me acho só, aparece de novo meu antigo desespero e pronuncia “Não!”.
Então, levantou a cabeça pela primeira vez desde que começara sua narração. Se eu não houvesse compreendido o que suas últimas palavras significavam, seu eloquente olhar o explicariam. Meus olhos se encheram de lágrimas; meu coração batia violentamente; minhas mãos nervosa e mecanicamente sacudiam e arrancavam a relva que estava junto a mim. Não era possível o silêncio por mais tempo. Falei, fazendo escassa conta do que ele dizia e despedaçando cada vez mais e mais a pobre e inocente relva, como se o objeto mais importante de minha vida houvesse sido destruir a maior quantidade no menor tempo possível.
—Conhecemo-nos muito pouco ainda — disse-lhe — e uma mulher é um débil aliado em uma situação tão grave como a tua; porém, por inútil que seja, conta-me agora e sempre como tua mais decidida amiga.
Chegou-se bem perto a mim e, sem dar-me tempo para falar mais, me tomou a mão e murmurou enternecido:
—Poderei eu contar contigo um dia como com a mais querida o verdadeira amiga? Perdoa-me, Mary, se te digo que te amo, que te amo como me tens ensinado a amar, como me tens ensinado a esperar? Em tuas mãos está a modificação completa da minha amarga sorte! Tu podes recompensar-me de tudo que hei sofrido. Tu podes lançar-me à conquista da minha liberdade e dos meus direitos! Ah! Sê o bom anjo da minha vida! Perdoa-me, ama-me, resgata-me, sê minha esposa!
Como sucedeu, o ignoro; só sei que me vi em seus braços e lhe respondi com um beijo. Tomando em consideração todas as circunstâncias do caso, sei que, aceitando Roland, cometi a leveza maior que cometeu jamais mulher alguma. Sim. Porém, não me pesou então, nem me pesa hoje, porque então e hoje fui o sou a mais feliz do todas as mulheres.
CAPÍTULO VII
Depois desta cena, era necessário que um de nós comunicasse a meu pai o que acabava de ocorrer. Após pensá-lo, persuadi-me de que essa missão tocava a mim e, no dia seguinte, a cumpri, repetindo-lhe exatamente a triste história de Roland como prefácio necessário ao compromisso que havia contraído.
Meu pai apresentou sérias objeções ao meu casamento e, nos termos os mais enérgicos e persuasivos, manifestou-me a imprudência de minha conduta. No caso que chegasse a casar-me, nossa felicidade dependia exclusivamente em anular, no seu todo, o parecer da comissão do exame, que condenou Roland, o que era pelo menos extremamente difícil. Assim, pois, cria meu pai que o mais conveniente seria adiar o nosso casamento até essa tentativa e ver o resultado. Este raciocínio era concludente, mas eu o embarguei. Quando ouviu a mulher amada a voz da razão? Parece-me que não se pode citar um único exemplo. Inúteis foram todas as palavras do meu pai para combater os desejos de Roland. Poucos dias faltavam já para findar a sua permanência em Eastbourne. Se eu consentisse em que ele voltasse ao seu asilo sem casar-me antes com ele, não se passariam meses, anos talvez, sem que pudéssemos realizar nossa união? Era possível que ele ou qualquer homem pudesse suportar essa cruel separação, essa mortal incerteza? Já seu espírito havia experimentado suficientes combates: não sucumbiria neste novo que se lhe impunha, mais angustioso que todos os anteriores? Estes argumentos me decidiram. Eu era maior de idade e livre, portanto, podia fazer o que quisesse.
Eu te dou completa liberdade, Alicia, para me considerares como a mais louca e obstinada das mulheres; e o fato é que, quinze dias depois de nossa partida do campo, se celebrou secretamente meu casamento com Roland, em Eastbourne.
Meu pai, meu bom pai, mais triste que amofinado, não quis presenciar a cerimônia, seja dito em seu abono. Meu irmão me acompanhou ao altar. Roland e eu passamos a tarde e parte da noite desse dia juntos. Às nove horas, como sempre, se retirou o foi à casa do doutor, explicando-me previamente que se achava à disposição do tribunal e que, até se não anular o parecer da comissão, nos convinha muito ter oculto o nosso enlace. Ao dar o relógio a última e fatídica pancada das nove horas, beijamo-nos e despedimo-nos até ao dia seguinte. Ah! Quem previra que, ao acompanhá-lo até a porta, que meses e meses se passariam sem torná-lo a ver? Na manhã seguinte, recebi umas breves linhas de meu esposo. Nosso casamento foi descoberto—como, nunca o soubemos—e comunicado ao doutor. Roland ia em caminho para seu antigo asilo, ameaçado de que se empregaria a força se intentasse resistir; porém, ele sabendo o quão inútil seria a resistência, e que só serviria para formular contra ele novos atos de loucura, se submeteu ao infortúnio com inteira resignação.
—Meu sacrifício está feito já — me dizia no fim da sua carta. — A ti toca agora ajudar-me. Ataca a comissão do exame sem perda de tempo.
Esta última recomendação era inútil. No mesmo dia, partimos para Londres, e conseguimos o auxílio de um inteligente advogado.
Meu pai tomou o negócio em mãos cheio de carinho e dedicação; bondade que eu sabia quanto era indigna de merecer. Apresentamos uma petição ao lorde chanceler, suplicando-lhe que se revogasse a decisão da comissão do exame.
Fundamos nossa petição nas declarações juradas dos amigos e vizinhos de Roland, durante ou seus três anos de residência nas imediações do lago. Estas nobres pessoas, ao aparecerem ante a Comissão, manifestaram, cheias de sinceridade, que Roland era, no conceito delas, um homem pacífico, inofensivo e que dispunha completamente de sua razão. Muitos tinham ido à caça com ele, outros o haviam acompanhado em excursões nos botes pelo lago: o poderia acreditar-se que o teriam feito sem terem plena confiança em Roland? Quanto aos atos de violência, de que se haviam valido seus parentes e herdeiros logais para o encerrarem como louco, se reduziam a estes: uma vez, em um momento de cólera, se havia atracado a um homem e severamente o injuriado. Fez mal, não duvido; porém, se fosse isto um ato de loucura, quantos loucos andam soltos por aí? Outros pretextos para provar a sua demência eram ainda mais absurdos. Todos estes argumentos foram apresentados ao tribunal e chegamos até a admitir que, em consequência de seus muitos infortúnios, meu esposo poderia ser considerado, talvez, como um excêntrico; se o era, não parecia mais conveniente e natural que o colocassem sob os carinhosos cuidados de uma esposa amante, que sepultá-lo vivo em um asilo, com loucos incuráveis por companheiro, e debaixo da autoridade de homens estranhos? Tal foi nossa petição.
A decisão nos foi contrária em todos os sentidos. Surdos à voz de nossas testemunhas e de nossos argumentos, os implacáveis juízes declararam que a asserção individual do doutor de que meu esposo estava louco era irrefutável; que Roland ficaria bem no asilo, com a consignação anual de 700 libras, e que ao asilo o enviavam para o resto de seus dias.
Quanto a mim, o resultado desta infame sentença foi destituir-me de minha posição de esposa de Roland, pois que, segundo a lei e a razão, os loucos não podem contrair casamento. Depois desta desastrosa provança, Roland pôde, todavia, conservar seu valor.
Não nos restava senão uma esperança: fugirmos. O preço de nossa liberdade, como cidadãos ingleses, era o desterro e o abandono da riqueza de Roland. Aceitamos estas duas condições. A hospitaleira América nos oferecia um refúgio, fora do alcance dos médicos, de doidos e dos juízes—a ela, como a uma segunda pátria, se dirigiu nosso coração. A dificuldade era realizar esse projeto.
Roland e eu havíamos intentado escrever um ao outro; porém, nossas cartas foram sempre descobertas e interceptadas pelo diretor do asilo. Havíamos tido afortunadamente a precaução de escrevê-las em cifras, segundo um sistema que Roland me tinha ensinado antes do nosso casamento; mas se nossas cartas foram indecifráveis, chegou-se a suspeitar, todavia, do nosso projeto, e puseram uma vigia a meu esposo, que acompanhava todos os seus movimentos.
Sendo-nos já impossível trocar cartas, continuamos nossa correspondência em cifras por meio dos periódicos. Este sistema também foi descoberto, e se proibiu a Roland subscrever periódicos e até entrar na biblioteca do asilo.
Porém, estas tirânicas medidas se tornaram demasiadamente tardias; já tínhamos o plano perfeitamente combinado, e realizá-lo era somente questão de tempo. Havíamos determinado que meu irmão e um amigo seu, com cuja descrição podíamos contar, vigiariam alternativamente todas as tardes, durante certo tempo, um lugar designado como de reunião a três milhas do asilo. O ponto, cuidadosamente escolhido, estava na orla de um arroio perto de espesso bosque. Escondemos no oco de uma de suas velhas árvores um saco de tela impermeável contendo uma muda de roupa, umas barbas postiças e alguns biscoitos. Meu irmão e seu amigo levavam sempre consigo seus utensílios de pescar e, cada vez que viam aparecer algum estranho, arrojavam o anzol no arroio, e pareciam entregues a este entretimento. Uma vez, o diretor do asilo passou junto a meu irmão e lhe perguntou, de boa-fé e cortesmente, se abundava a pesca.
Isto durou quinze dias, sem que o fugitivo aparecesse. Ao fim de uma tarde, às últimas luzes do crepúsculo, e no momento em que meu irmão se preparava para retirar-se, Roland apareceu subitamente a seu lado.
Sem perder um momento em inúteis palavras, internaram-se ambos no bosque, tomaram o saco e, dez minutos depois, meu esposo estava perfeitamente disfarçado com suíça e uma blusa de trabalhador. Em seguida, empreenderam caminho pelo bosque até que a escuridão da noite chegou a ser completa. O céu estava nublado e, depois de andar em duas milhas pela espessura, tomaram a estrada de Manchester, a umas trinta milhas de distância desta capital.
No caminho, Roland explicou a meu irmão o meio de que se havia valido para evadir-se. Foi sumamente simples. Havia fingido um mal de nervos e suplicou que levassem a comida a seu quarto. Nos primeiros quinze dias, os homens empregados para vigiá-lo haviam sido muito mais fortes que ele; o que entrou em serviço, nos princípios da terceira semana, era muito menos temível que os seus predecessores. Em vista desta oportunidade, Roland decidiu cometer outro “ato de violência” à chegada da tarde e, no momento propício, se lançou sobre o homem, deitou o por terra, tapou-lhe o boca com um lenço, atou-lhe fortemente os braços e as pernas e o colocou em sua própria cama, arrojando-lhe uma coberta por cima. Previamente, havia tomado a precaução de unir os lençóis e, deste modo, serviram para descer do seu quarto ao pátio pela janela. O sol descambava naqueles momentos, e os empregados do asilo tomavam chá. Atravessou o pátio, escapando milagrosamente de ser reconhecido por um lavrador empregado em arranjar o jardim. Saltou a grade e se viu no outro lado livre, inteiramente livre!
Ao chegar à estrada de Manchester, meu esposo, que é vigoroso caminhador, seguiu adiante; porém, meu irmão se separou dele e veio comunicar-me a almejada notícia.
Na manhã seguinte, tomei o primeiro trem para Manchester e me hospedei nos subúrbios da cidade, num ponto designado de antemão por meu esposo, muito perto a uma praça pequena e pouco concorrida. Havíamos convencionado que o primeiro que chegasse a Manchester passearia por esta praça de meio-dia a uma hora da tarde e das seis à sete da noite; esta foi a hora que alcancei-o e, pouco depois de estar passeando, chegou-se perto de mim um homem de espessa barba, empoeirado e grosseiramente vestido. Ao encara-lo surpreendida, sorriu-se. Ah! Conheci aquele sorriso num instante e, apesar dos tribunais e da funesta comissão de exame, me vi de novo nos braços de Roland!
Vivemos tranquilamente em nosso retiro por um mês, durante o qual, segundo soube por cartas de meu irmão, nada do que o dinheiro e a atividade humana podem conseguir deixou de empregar o diretor do asilo e seus cúmplices para descobrir Roland. Porém, esta vez, por fortuna, o triunfo foi completamente nosso. No fim do dito mês nos dirigimos para o norte, atravessamos o canal e passamos uns quinze dias muito agradáveis em Dublim, dali seguimos Cork e Queenstown, donde, confundidos entre uma multidão de emigrantes, nos embarcamos em um vapor para a América.
CONCLUSÃO
Esta é a minha história, Alicia, e te a escrevo de um sítio no oeste dos Estados Unidos. Nossos vizinhos são, talvez, pouco sociáveis; porém, decerto que são menos temíveis que os médicos alienistas e a justiça do meu país. Nossos recursos consistem só no que produz nossa pequena fortuna herdada de minha mãe, o que é bastante para ponto de partida da nova existência que temos escolhido. Esperamos que meu pai e irmão nos façam uma visita no próximo verão e é provável que então encontrem na família mais uma pessoa.
Estamos compensados aqui de nosso desterro de Inglaterra e da perda da riqueza de Roland? Talvez. Por lá parece que há quem diga de nós: “O esposo de Mary Branding está louco e ela não o está menos”. Se depois de fixares teus belos olhos nestas linhas te achares inclinada a modificar a tua opinião, e se ainda te lembras com tanta ternura como eu de nossos bons tempos de colégio, com tua carta devolve-me os beijos de que vai esta cheia para ti.
Nota do editor original: A principal importância desta história consiste em ser ela verdadeira. O autor, que, como todos sabemos, é um dos melhores romancistas ingleses agora vivos, esteve há poucos meses nos Estados Unidos e, aqui, encontrou a Alicia, e seu marido. Tendo vários periódicos duvidado da história, Mr. Wilkie Collins publicou ainda mais pormenores que deixaram inteiramente provada a sua autenticidade.
Fonte: “O Novo Mundo”/Nova York/EUA, edição de 23 de janeiro de 1875.
Ilustração: P.S./Copilot.
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